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PROTAGONISTAS

Sinéia

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“Quando a gente fala de mudanças climáticas” - um tema novo para os povos indígenas - eles não usam esse termo, eles falam da transformação do tempo. “Está mudando, mudou, a chuva se intensificou, o verão se intensificou, está havendo uma transformação do tempo.”

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A mulher indígena lida diretamente com a floresta, ela busca os frutos, ela busca as sementes, as palhas, o cipó pra fazer o artesanato. E ao trabalhar com artesanato, com a medicina tradicional, com a plantação na roça, ela observa muito o ciclo do tempo e essa questão da transformação do tempo. Através de seus conhecimentos, da vivência das mulheres com a floresta, elas trazem relatos concretos das mudanças que elas já estão vendo. Das mudanças que elas estão vendo na floresta, na água, na produção dos alimentos. Por isso elas têm um papel muito importante na gestão do território.

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Os povos indígenas são uma barreira contra o desmatamento. E quando a gente vê nossos diretos sendo retrocedidos, por exemplo, na revisão das demarcações de terras indígenas que está sendo discutida no Congresso, isso não é uma ameaça só para os povos indígenas, para o seu bem viver na sua terra. Isso está ameaçando a humanidade como um todo.

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Nessas grandes conferências climáticas eles falam que a Amazônia é o pulmão do mundo. Mas, como ser o pulmão do mundo sem um tratamento adequado para esse pulmão? Uma hora dessas, ele vai parar se nós não dermos realmente o que é de direito a esses povos, povos tradicionais, povos indígenas, ribeirinhos, que mantêm a floresta em pé. É um reconhecimento que o governo deve ter. O governo, por dever, tem que ter políticas públicas para implementar ações de fortalecimento, principalmente na questão de demarcação dessas terras. Mas hoje nós não temos políticas públicas para os povos indígenas que estão lá na ponta, fazendo esse trabalho não só para o Brasil, mas para toda a humanidade.

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E nós, as poucas mulheres que já estão discutindo sobre o tema, temos também um grande desafio em trazer essas informações de volta para as comunidades, ser multiplicadoras dessas informações e incidir politicamente nesses espaços de governo, nesses espaços que tratam sobre esses temas, nessas grandes conferências climáticas. Incidir com qualidade e poder levar ali a voz das mulheres indígenas.
E dizer que elas precisam de políticas públicas voltadas para as mulheres, principalmente quando se trata dessa temática de mudança climática, que envolve todo o conhecimento que a mulher tem.

 

Eu vejo que o desafio principal é esse: implementar ações que fortaleçam nossos povos, para eles continuarem fazendo a manutenção da floresta como sempre tem têm feito.

 

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Almerinda Ramos de Lima pertence ao povo Tariano da Comunidade Boa Esperança, na Terra Indígena do Alto Rio Negro, no Médio Uaupés, estado do Amazonas. Seu nome indígena é Nanayo. Foi a primeira mulher eleita presidente da FOIRN – Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro.

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Francisca Oliveira de Lima Costa (nome indígena Yaka) pertence ao povo Shawandawa da Terra  Indígena Arara do Igarapé Humaitá, Aldeia Foz do Nilo, no Acre. É professora e coordenadora da OPIAC - Organização dos Professores Indígenas do Acre e assessora da AMAAIAC - Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre.

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Floriza

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É um tempo muito diferente que nem os espíritos estão conseguindo entender e segurar essas coisas que vão acontecer. Eles já estão cansados dessas destruições. O branco não olha mais para a floresta, para a natureza, não liga mais para os espíritos. Não sei o que eles pensam.

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São os espíritos que seguram o céu para nós, Yanomami, porque somos da terra, do mato. Porque a gente nasce, cresce e morre aqui mesmo, na floresta.

 

Floriza da Cruz Pinto pertence
ao povo Yanomami de Maturacá, Terra Indígena Yanomami, no Amazonas. É coordenadora da Kumirãyõmã, primeira associação de mulheres yanomami no Brasil.

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Sinéia Bezerra do Vale pertence ao povo Wapichana, Terra Indígena Serra da Lua, Comunidade Malacacheta, Roraima.

É coordenadora do Departamento de Gestão Territorial e Ambiental do CIR - Conselho Indígena de Roraima, e coordenadora da Câmara Técnica de Mudanças Climáticas do Comitê Gestor da PNGATI (Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas). e membro do Comitê Indígena de Mudanças Climáticas – CIMC.

Almerinda

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Hoje, por causa das mudanças climáticas está tudo descontrolado”, meu pai diz. Os nossos avós sempre diziam para estarmos preparadas. Eles tinham essas visões de que o tempo mudaria. “Vai haver muita fome, vai haver muita quentura, muita gente vai morrer de fome.” A gente era criança e não entendia quase nada. Mas hoje dá para ver o que eles queriam dizer com isso. Eles estavam dizendo que haveria essa mudança do clima, que o aquecimento global traria muitos impactos para o meio ambiente. Isso era o que eles queriam nos transmitir na linguagem deles.

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As mulheres percebem os impactos. E não só percebem como elas têm uma grande preocupação, principalmente com as sementes. Se o aquecimento aumentar, apesar delas terem um cuidado especial, tem sementes que não tem como manejar. Como elas vão conservar e manter as sementes se continuar desse jeito? Com essas mudanças, elas correm o risco de se perderem para sempre. Será que vamos conseguir sobreviver?

 

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Francisca

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Tem conhecimento que só a mulher indígena domina. E isso precisa ser respeitado e valorizado.

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Nós mulheres indígenas, cuidamos das sementes tradicionais, do resguardo das línguas indígenas, da repartição dos alimentos, da colheita, do preparo da alimentação.

As mulheres conhecem as picadas, os igarapés, sabem onde pescar, sabem onde tem caça, onde as frutas estão caindo. Então as mulheres têm um conhecimento muito profundo sobre esse tema da política de gestão territorial e ambiental.

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E nós temos nosso calendário próprio, de plantio, das festas da caiçuma, do milho. Antes a gente sabia quando era o tempo do verão, da friagem, o tempo de plantar e colher. De uns anos para cá nós percebemos os impactos das mudanças climáticas no nosso povo. Estamos percebendo essa mudança do tempo. E estamos preocupados porque precisamos nos preparar para esses impactos.

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Nunca nada foi fácil para nós. E a gente nunca vai parar de lutar, porque nós conseguimos tudo com muita luta. Hoje a gente também não tem que partir só para briga, com arco e flecha. A gente tem que saber brigar, dialogar, de igual pra igual. Ir para mesa de negociação mostrando: “Olha Governo, nós estamos fazendo, e isso dá certo. Vocês têm que respeitar”.

Se a gente tem uma política de gestão territorial, mantém a floresta em pé, cuida das espécies, cuida do clima, cuida do planeta, nós não fazemos esse trabalho só para nós. A gente
faz para o Acre, para o mundo, para o clima e para o planeta.

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Cantar, marcar uma data para
a sua colheita, agradecer a terra
para que dê bons frutos na colheita,

para dar muita caiçuma, muito milho e amendoim.

 

   Maria Almira Caxambú Kaxinawá

 

 

 

 

 

 

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Que essa taioba produza muito
Que essa taioba produza muito
Você, alimento, não nasça feio, ruim.
Que essa taioba produza muito
Que essa taioba dê muito
Ficarei muito feliz
Com muita alegria eu virei te buscar com meu paneiro.
Assim falamos no momento de plantar,

ensinamos assim as plantas.

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                                                                       Úrsula Yanomami

 

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Minhas manivas, minhas amigas,

eu plantei vocês com muito carinho para nos alimentar.
Minhas colegas e eu pedimos,
Avó da Fartura, que faça as manivas crescerem com abundância.
Nos dê os alimentos, Avó da Fartura.
Faça com que essas manivas cresçam.

Eu viajarei, minhas manivas, mas vocês ficarão bem.
Eu vou voltar para cuidar de vocês em breve.”

 

    Ernestina Alves

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